Paralisação
Alunos do Assis Brasil e Dom João Braga ocupam as escolas
Instituto de educação foram os primeiros em Pelotas a ter ações de estudantes; debates devem ocorrer com a participação de professores
Paulo Rossi -
Alunos do Dom João Braga ocupam a escola na noite desta segunda (Foto: Jô Folha - DP)
O primeiro dia de greve na rede estadual de ensino, em Pelotas, encerrou com ocupação de alunos em duas instituições. Estudantes do Instituto de Educação Assis Brasil (IEAB) e do Colégio Dom João Braga decidiram se juntar ao movimento que começa a se espalhar pelo Rio Grande do Sul e se instalaram nas escolas, com malas, mochilas e a determinação de permanecer por tempo indeterminado; assim como a paralisação dos professores deflagrada em assembleia na última sexta-feira. A expectativa é de que, nas duas instituições, as mobilizações cresçam a partir do diálogo e do chamamento de outros jovens.
Nesta terça-feira (17), a partir das 14h30min, também será a vez de professores e funcionários reunirem-se em plenária promovida pelo Cpers-Sindicato, para definir calendário de manifestações, realizar balanço e traçar ações que resultem em mais profissionais de braços cruzados, em Pelotas. Em Porto Alegre, haverá audiência da categoria com membros do primeiro escalão do Governo Sartori.
Ontem, a 5ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) não possuía levantamento sobre o número de escolas que interromperam as atividades. O contato, mais uma vez, foi realizado por e-mail, para facilitar a apuração junto às 131 instituições dos 18 municípios da área de abrangência, mas a grande maioria não respondeu. Para o Cpers-Sindicato, 70% da categoria teria aderido ao movimento. Um panorama que tende a crescer nos próximos dias, apesar do anúncio do governo do Estado de que irá cortar o ponto dos trabalhadores.
"Não nos restou outra alternativa, além da greve", argumenta o coordenador do 24º Núcleo do Cpers, Mauro Amaral. Negociar o pagamento dos dias parados, ao final da mobilização, será o caminho - reitera. "É o instrumento que o governo tem para tentar desorganizar o movimento. Faz parte da pressão e da disputa."
Engajamento estudantil e pedido de apoio
O resultado da assembleia estudantil está logo na fachada da maior escola estadual de Pelotas: Ocupada. Vários cartazes anunciavam desde a manhã de ontem a decisão dos alunos do Assis Brasil em acampar na instituição por tempo indeterminado. Os estudantes aproveitaram a segunda-feira para elaboração de carta e definição das atividades que deverão desenvolver nos próximos dias. A expectativa é de que o movimento ganhe adesão de outros jovens, além dos integrantes do Grêmio, a partir de amanhã.
Debates sobre direitos humanos, gênero e violência devem ocorrer, com a participação de professores. A mobilização, em apoio à greve, também deve contar com jogos e música. "Aqui todo mundo será um. São pessoas diferentes, separadas, mas com um mesmo propósito", afirma o adolescente Iury Matos, 17. A situação da escola pública no Rio Grande do Sul, em especial o atraso no repasse de verba de autonomia das escolas, também devem entrar na pauta de discussões. "O movimento dos alunos se transformará em uma grande aula de cidadania", analisa a diretora Magna Lameiro.
Aliás, a articulação dos alunos em defesa de Uma educação de qualidade era a única movimentação em salas e corredores. Como de praxe, os profissionais do IEAB acataram o chamamento da categoria e, aproximadamente, dois mil estudantes tiveram de ficar em casa.
Tempo de aula e conteúdo não são prioridade agora
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) será enfrentado no segundo semestre. Ainda assim, permanecer sem aulas neste momento não é sinal de dor de cabeça aos estudantes que, ontem à noite, comandavam a ocupação no Colégio Dom João Braga, onde a adesão dos professores é parcial à greve. "Não nos sentimos prejudicados. Confiamos nos professores e vamos dar o melhor de nós, depois, mas agora entendemos que a greve é a solução. É necessária", resume a jovem Maria Fernanda Nieves, 16.
Alunos do Assis Brasil organizaram a ocupação, que deve começar efetivamente nesta terça (Foto: Paulo Rossi-DP)
E, ao servir de uma das porta-vozes do grupo, admite: o ato é político. E, para não ser confundido com zoeira ou festa, a partir desta terça, a intenção é de estender o debate a todos os turnos, com um mesmo alerta: é da dedicação diária de professores - com salários achatados e, não raro, condições precárias de trabalho - que dependerá a formação de todos os profissionais que um dia chegarão ao mercado. E, por isso, o eco que procuravam propagar, acomodados no auditório, era reto: "Deu. Queremos ser respeitados e queremos ter voz. Não aceitamos o parcelamento dos salários nem o sucateamento das escolas", reforça a estudante do 3º Ano do Ensino Médio, Karima Majdoub, 16.
Dois lados
O diretor do Colégio, Marcelo Coelho Denis, diz apoiar a articulação dos alunos, mas alerta que, em respeito à democracia, precisa manter o local de portas abertas, para garantir o acesso de professores, funcionários e alunos que decidirem não parar. Tradicionalmente, a instituição divide opiniões. Desde ontem, os horários das turmas passaram a ser reorganizados, com base na disponibilidade dos educadores que não aderiram. Pela manhã, por exemplo, a metade dos professores não compareceu. Entre os funcionários, nenhum havia interrompido as atividades.
Confira o reflexo em outras escolas de Pelotas
Cassiano do Nascimento - Apenas os alunos das Séries Iniciais, no turno da tarde, terão aulas; como já havia ocorrido em 2 de maio, no dia de paralisação. Pela manhã, apenas dois professores contratados compareceram, assinaram o ponto, mas também não deram aula. A escola, com aproximadamente 1,2 mil estudantes, é uma das maiores da rede estadual em Pelotas.
Félix da Cunha - O atendimento também era parcial, nos três turnos. A orientação é de que os pais dos alunos entrem em contato com a escola para verificar se é caso de encaminhar o filho à escola.
A voz estudantil pelo Estado
O coro dos estudantes, em apoio aos professores e contra a precariedade das escolas, ganha cada vez mais força no Rio Grande do Sul. Até o final da tarde de ontem, 23 instituições já contavam com ocupação de alunos - indicavam os levantamentos do Cpers-Sindicato e da Comunidade Ocupa Tudo RS, no Facebook. Confira o roteiro:
Pelotas - Alunos das escolas Assis Brasil e Dom João Braga começaram ontem as mobilizações e já dormiram nos locais, acompanhados por professores ou pais de alunos.
Paralisação no Assis Brasil junto alunos e professores (Foto: Paulo Rossi - DP)
Rio Grande - A expectativa é de que nos próximos dias os estudantes das sete escolas ocupadas realizem ato em conjunto. Veja o andamento:
* Juvenal Miller - O apoio da comunidade cresce e várias doações de alimentos chegam para subsidiar as refeições. A estimativa é de que cerca de 70 alunos estejam diretamente envolvidos na mobilização. Estudantes da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) e integrantes de movimentos sociais também dão suporte aos adolescentes. "Até o momento, nenhum pai ou responsável se mostrou contrário", garantiu a vice-diretora Débora Silveira.
* Bibiano de Almeida - Os alunos também estão organizados em esquema de revezamento e prometem permanecer por tempo indeterminado. O limite de horário para quem deseja passar a noite está fixado em 19h30min, por questões de segurança.
* Silva Gama - Debates, sessão de cinema e confecção de cartazes integram as atividades, que têm um objetivo central, para além do apoio à greve. "Não queremos ficar aqui sem propósito. Não é o nosso foco. Queremos conhecer melhor o nosso passado histórico", defende a primeira-secretária do Grêmio Estudantil, Nathali Lemos, 16.
* Marechal Mascarenhas de Moraes - A fase ainda era de organização do movimento na tarde de ontem. Um pequeno grupo de alunos já dormiria na instituição.
* Lilia Neves - A articulação dos alunos teve início ontem, em meio à adesão parcial à greve. Uma programação cultural também deve começar a ser desenvolvida a partir desta terça. A estimativa é de que entre 70% e 80% dos professores interromperam as atividades - informa o diretor Adaidides Cardoso.
* Getúlio Vargas - Em torno de 20 estudantes lideram a ocupação desde as 8h de ontem.
* Roberto Bastos Tellechea - A escola também compõe a lista das instituições que se juntaram à greve. Nenhuma informação adicional foi repassada ao Diário Popular, no início da noite de ontem.
Porto Alegre - Onze instituições ainda engrossam o movimento desencadeado pelos estudantes, na capital: Padre Reus, Júlio de Castilhos, Agrônomo Pedro Pereira, Ernesto Dornelles, Inácio Montanha, Infante Dom Henrique, Paula Soares, Presidente Costa e Silva, Protásio Alves, Roque Gonzales e Santos Dumont
Passo Fundo - a mobilização é dos alunos da Escola Eulina Braga.
Ijuí - O apoio é desencadeado por estudantes das escolas Rui Barbosa e Técnica Estadual 25 de Julho.
O que busca a categoria
Educadores, alunos, pais e comunidade escolar devem se reunir em frente à Secretaria Estadual de Educação. Às 9h, o Comando de Greve será recebido para a audiência com o secretário da Fazenda, Giovani Feltes, o chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi e o secretário adjunto de Educação, Luís Antônio Alcoba de Freitas. "Vamos mostrar a força da nossa unidade, que desta vez conta com o importante apoio dos alunos. Juntos vamos impedir que este governo destrua a educação pública", conclamou a presidente do Cpers, Helenir Aguiar Schürer.
As questões financeiras são a grande motivação da greve. Só neste ano, o governo de José Ivo Sartori (PMDB) já adotou o parcelamento de salários por duas vezes. E os reajustes também não têm repercutido no bolso dos trabalhadores. Em 2015, o aumento do Piso Nacional do Magistério foi de 13,01% e, em 2016, foi de 11,36%, mas nenhum deles foi repassado à categoria. Os atrasos recorrentes no repasse das verbas de autonomia das escolas e o déficit de pessoal, principalmente de funcionários, também aparecem entre as cobranças.
Posição do governo
Ao se manifestar na tarde de sexta-feira, o secretário adjunto da Educação garantiu não haver condições de oferecer reajuste aos professores. "A situação financeira não permite suportar qualquer tipo de reajuste. O Estado está exaurido", sustentou. Freitas assegurou ainda que, depois de rigoroso estudo do quadro, o governo estaria adotando providências para suprir a falta de pessoal, através de medidas, como o aumento da carga horária de profissionais de 20 para 40 horas. Negociações com a Secretaria da Fazenda do Estado, para colocar o repasse das escolas em dia, também estariam entre as prioridades.
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